Muitas histórias me foram contadas ao longo de minha vida profissional.
Algumas ficaram marcadas como símbolos de experiências marcantes do trabalho do magistério ,mais do que de trabalho pedagógico, mas mais como vivência humana da profissão.Aqui estão duas histórias.
Arroz e Alface:
Uma jovem professora me contou,lá no Vale do Ribeira,que havia sido professora em classe de emergência,no meio rural, no início de sua carreira.Passava a semana no sítio na casa de um dos alunos e somente ia para casa nos fins de semana.
Era uma família muito pobre que vivia de produtos de subsistência menos do que básica. No início da semana quando voltava para a escola trazia alimentos para o seu sustento,frutas, biscoitos,enlatados, biscoitos e como era quase uma menina também doces, chocolates etc.
Ao chegar na casa era-lhe impossível fazer sua refeição em particular diante dos olhos extasiados das crianças. Distribuía e em dois dias já haviam consumido tudo. No resto da semana eles (inclusive ela) comiam, no almoço e no jantar, arroz e alface. E foi assim todo o tempo em que ela lá permaneceu. Disse-me ela que chorava, depois que se removeu para outro lugar,ao lembrar daquelas crianças que esperavam ansiosas por sua chegada todas as segundas feiras.
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Amassando barro:
Depois da alguns anos, como Diretora de uma escola de periferia, aqui em São Paulo, ouvi de uma professora, já prestes a se aposentar ,a memória de um fato que me encantou pela singeleza e beleza. Contou-me que ao iniciar sua atividade de professora,foi designada para uma classe no meio rural de uma localidade distante.Naquela época por causa da dificuldade de locomoção, as professoras viviam dentro da própria escola,(em geral nos sítios)onde havia uma cama, um armário, um fogão, uma cadeira e uma bandeira.
A professora passava todo o seu tempo ali e só se ausentava nas férias. Ali ela administrava lecionava, ensinava hábitos de higiene e orientava os pais quando precisavam de documentos e como deveriam fazer para consegui-los.Fazia a merenda escolar e vistoriava cabelos e unhas dos alunos.Supervisionava atitudes...
Nos feriados cívicos,reunia a turma no chão batido à frente da escola e hasteava a bandeira, cantando com os alunos o Hino Nacional.
-Bem, disse-me ela, num dia de Sete de Setembro, um Supervisor de Ensino, que na época tinha por função visitar essas "salas avançadas" do meio rural, chegou de repente, emocionado contou-lhe que não esperava encontrá-la reunida com seus alunos, em comemoração...mas , que ouvira ao longe, o canto das crianças, ecoando através da mata que cobria a região, fato que o fez ir até lá verificar.
Esta mesma professora...passados quase trinta anos, esperava sua aposentadoria integral que finalmente chegou. Ao sair, na despedida, ela me disse: Como é a vida!Estou acabando minha missão do mesmo jeito que comecei.Amassando barro!
De fato, a "nossa escola" era numa rua sem calçamento aguardando ainda pavimentação de rua.
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Guaraciaba Perides (2012)
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